Obscura

Existe um lado obscuro em mim que morre de medo de ser feliz e se recusa a acreditar que merece ser amado.

Na maior parte das vezes esse lado vence.

A parte que grita que sou digna e que mereço afeto e tranquilidade é silenciada, ofuscada pela obscura que fala baixo, mas quase sempre se sobressai.

A obscura procura defeitos onde eles não existem, recusa-se a sair de casa, desmarca planos, antecipa os sofrimentos e sempre, sempre acredita estar incomodando.

Ela vê a si própria — e a mim — como um fardo, mas se recusa a dar qualquer espaço para a parte que busca a felicidade.

Mas a pior parte é que ela acerta. Acerta tantas vezes que em determinados momentos eu realmente acredito que não sou merecedora de nada de bom.

Até que chega um dia que ela erra.

No primeiro dia, ela jurou que a felicidade inventaria uma desculpa para nunca chegar.

Ela estava errada no segundo dia também, quando esbravejou que tudo seria diferente após o primeiro.

A obscura — felizmente — errou pela terceira vez, quando sussurrou, bem baixinho: “a felicidade não vai ficar”, possibilidade que me causou arrepios até o último minuto.

Com os meus pés bem grudados no chão, eu torço para que ela continue errando.

Mas também espero que, mesmo quando ela — por um acaso — acertar, eu ainda seja capaz de ouvir a parte que grita que eu tenho valor.